Uma análise sobre propriedade intelectual, prática esportiva e o Âmbito Esportivo Institucional
O publisher ou developer é e sempre será o proprietário do que cria e desenvolve — do jogo, de suas marcas, de sua infraestrutura e de seus eventos oficiais. Essa soberania é amplamente reconhecida e respeitada: o que é produzido e organizado pelo publisher nos seus próprios campeonatos é dele, e assim continuará sendo.
Os publishers estão — com justiça — de parabéns. Sem o investimento criativo, tecnológico e financeiro das empresas que desenvolvem e mantêm os títulos, não haveria base para que a prática competitiva florescesse. Seus circuitos proprietários elevam padrões de produção, fortalecem a marca do jogo, impulsionam inovação de mecânicas e anti-cheat, e funcionam como funil de talentos que a comunidade e o âmbito institucional aproveitam. Reconhecer esse mérito é essencial para qualquer discussão honesta sobre os esports.
1) O que está em jogo quando alguém diz que “esporte eletrônico (esports), têm dono” A frase é sedutora: como o jogo é de um publisher, então o esport teria dono. Isso confunde duas coisas distintas:
Essa realidade, no entanto, nada tem a ver com os eventos e competições realizados no Âmbito Esportivo Institucional. São esferas distintas, que podem e devem coexistir. Na verdade, um modelo engrandece o outro: sem o trabalho criativo e tecnológico dos publishers/developers, não haveria base para o esporte eletrônico institucionalizado; e, por outro lado, o Âmbito Esportivo Institucional amplia o ciclo de vida das franquias, expande mercados e fortalece comunidades competitivas em torno de cada jogo, em cada servidor e cada franquia comercializada.
Este artigo dá continuidade às reflexões apresentadas em “Esports no Brasil – Legislação, Legitimação, Alto Rendimento e Inclusão”, aprofundando o debate sobre propriedade intelectual, institucionalização e convivência saudável entre mercado e sistema esportivo.
Dois conceitos diferentes: propriedade intelectual e prática esportiva institucional
É comum ouvir, especialmente entre aqueles que resistem à institucionalização do Esporte Eletrônico, que “os esports têm dono” — argumento baseado no fato de que a prática acontece dentro de jogos eletrônicos que pertencem a publishers e developers, que detêm servidores, marcas e direitos de propriedade intelectual.
Essa visão, porém, mistura dois conceitos distintos: a propriedade intelectual do software e a prática esportiva organizada no Âmbito Esportivo Institucional. São esferas diferentes, regidas por marcos legais e institucionais próprios, como as Leis de Propriedade Intelectual (Lei nº 9.610/1998 no Brasil e tratados internacionais como a Convenção de Berna), a Lei Geral do Esporte (Lei nº 14.597/2023, especialmente os artigos 18 e 18-A), o Código Civil, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e outras leis trabalhistas específicas que reconhecem e protegem o atleta como profissional de natureza especial, com direitos e garantias próprios, reconhecendo sua atividade como trabalho digno e protegido.
O publisher detém direitos de propriedade intelectual sobre o software, marcas e serviços (LDA 9.610/1998; Lei do Software 9.609/1998). Já a prática esportiva eletrônica é reconhecida no ordenamento como esporte (LGE 14.597/2023) e se organiza por regras competitivas, ranking, arbitragem e calendário — elementos que não são propriedade de quem criou o código.
Novamente: o publisher detém a obra (código, artes, marcas) e controla serviços online; já a prática esportiva — calendário, regras competitivas, arbitragem, ranking, integridade e formação — pertence à esfera esportiva e social, com legitimidade para se organizar de forma federativa e confederativa. Esses dois planos não se excluem: se complementam. O circuito do publisher promove a experiência oficial da franquia; o circuito institucional garante neutralidade, continuidade multijogo, proteção ao atleta e previsibilidade para clubes, escolas e patrocinadores.
A história do esporte já mostrou exemplos semelhantes. O futebol não pertence a quem fabrica a bola; o basquete não pertence à Spalding ou à Wilson; no automobilismo, a FIA não fabrica os carros. Em todos os casos, o equipamento é propriedade privada, mas a prática esportiva é regulada e organizada por entidades independentes que convivem e negociam com fabricantes e fornecedores.
Um marco conceitual importante foi a mudança de terminologia: de “Competições de Jogos Eletrônicos” para “Esporte Eletrônico” (esport). Essa mudança insere a modalidade no Âmbito Esportivo Institucional global, reforçando seu caráter de manifestação cultural e social e afastando a noção de monopólio.
O que realmente pertence ao publisher
O publisher ou developer detém a propriedade intelectual do jogo: código-fonte, personagens, trilha sonora, design, marcas registradas, servidores e infraestrutura técnica, além dos direitos comerciais sobre campeonatos oficiais que organiza. Esse patrimônio é protegido por leis nacionais e internacionais de Propriedade Intelectual.
O que não pertence ao publisher
O esporte eletrônico, enquanto prática cultural e competitiva no Âmbito Esportivo Institucional, não é propriedade de um publisher. A organização de rankings, regulamentos, calendários, tribunais esportivos e instâncias disciplinares é responsabilidade de federações e confederações, que atuam amparadas por Leis do Esporte, Código Civil e legislação trabalhista específica para atletas.
No Âmbito Privado, publishers, developers e organizadores de eventos têm objetivos legítimos e claros: gerar retorno sobre investimento e valor para seus shareholders. Essa visão está correta e é inerente à lógica empresarial — qualquer empresa com investidores e responsabilidades de mercado precisa focar em resultados financeiros.
As competições privadas são, naturalmente, voltadas às próprias franquias, sem necessidade de integrar jogos ou publishers diferentes (sem cross-promotion). O objetivo é fortalecer a marca, aumentar o engajamento e impulsionar as vendas daquele título. Quando uma franquia deixa de ter relevância comercial ou estratégica, é comum que o foco se volte para novos projetos, com redução ou encerramento de suporte, atualizações e manutenção de servidores.
Esse modelo cumpre perfeitamente seu papel no mercado. Já o Âmbito Esportivo Institucional tem finalidades distintas: garantir continuidade competitiva, fomentar a base, promover inclusão e desenvolvimento educacional, apoiar o alto rendimento e integrar-se ao movimento olímpico.
A diferença entre “jogo eletrônico” e “esport”
O jogo eletrônico é um produto de entretenimento protegido por direitos autorais. Já o esport é uma prática estruturada e competitiva, organizada no Âmbito Esportivo Institucional, com legislação, regulamentos e estrutura federativa própria, como prevê a Lei Geral do Esporte no Brasil (Lei 14.597/2023), especialmente nos artigos 18 e 18-A.
Essa distinção é crucial: ao se enquadrar como esporte, a modalidade adquire natureza jurídica distinta, passando a integrar o patrimônio esportivo e social. Entidades como a CBDEL adaptam formatos competitivos ao Âmbito Esportivo Institucional, respeitando integralmente a propriedade intelectual do jogo.
Como os papéis se complementam (objetivo)
Ainda pensando na frase: “posso desligar os servidores e tudo sumirá portanto sou dono do esports sim”.
Dono do jogo não é dono do esporte. O publisher pode criar, atualizar, rentabilizar e até descontinuar serviços online do seu título — e esse poder é legítimo no campo da propriedade intelectual (PI) e da prestação de serviços. Mas o esporte eletrônico, enquanto prática reconhecida e organizada por regras competitivas, arbitragem independente, calendário e ranking, pertence à esfera esportiva e social, não à lógica proprietária de um único agente econômico. Desligar servidores limita um meio de acesso oficial; não extingue a modalidade competitiva já consolidada, que pode operar em versões estáveis e sob governança federativa/confederativa. A solução madura é a coexistência regulada: licenças claras, limites de marca, mecanismos de integridade compartilhados e cláusulas de sunset que garantam continuidade competitiva sem ferir direitos autorais. Assim, preserva-se o legítimo domínio do publisher sobre a obra e consolida-se a liberdade do esporte — multijogo, multientidade e orientado ao interesse público do ecossistema.
Respondendo aos críticos contrários às confederações
Quando o publisher alega que pode encerrar updates ou o servidor e, por isso, seria “dono do esporte”, o que se demonstra é controle técnico sobre um serviço, não monopólio sobre a prática esportiva que emergiu dessa obra. A competição pode operar em versões estáveis (patch “congelado”), em LAN ou sob licenças específicas; e as federações/ confederações permanecem responsáveis por integridade, calendário, saúde e educação — camadas que não dependem de patches novos. O caminho maduro é pactuar convivência regulada, preservando a PI do publisher e a liberdade do esporte.
Conclusão
Publishers e developers são donos do jogo, mas não do esporte eletrônico no Âmbito Esportivo Institucional. O uso do termo Esporte Eletrônico é, por si só, uma afirmação de autonomia e integração ao ecossistema esportivo mundial.
Em suma, os dois lados devem coexistir. O publisher merece reconhecimento pelo que criou e sustenta; o sistema federativo/confederativo merece autonomia para organizar a prática esportiva de forma neutra e contínua. Com licenças claras, cláusulas de sunset e coordenação de integridade, preserva-se o domínio legítimo do publisher sobre a obra e a liberdade do esporte — fortalecendo toda a cadeia: atletas, clubes, escolas, patrocinadores e comunidades.
Assim como já destacado em “Esports no Brasil – Legislação, Legitimação, Alto Rendimento e Inclusão”, o caminho ideal é o da cooperação estratégica, que respeita a propriedade intelectual, fortalece a independência e a legitimidade da prática, e garante sua sustentabilidade.
Nesse modelo, todos ganham: publishers expandem mercados e receitas; atletas e clubes conquistam estabilidade e oportunidades; e o esporte eletrônico se consolida como fenômeno global, democrático e alinhado aos princípios universais do esporte.
A WESCO, junto à PAMESCO, ACDS e AESF (incluindo participação nos Jogos Asiáticos), assim como à IESF no cenário internacional, atua nesse alinhamento, construindo padrões, fomentando o reconhecimento institucional e unindo o setor público e privado em prol do crescimento sustentável da modalidade.
Afinal Esports têm dono ou não? Por que a resposta importa — e como federar sem ferir a propriedade intelectual
Tendo em vista o conteúdo lógico do texto acima vamos as pontuações diretas e curtas.
1) O que está em jogo quando alguém diz que “esports têm dono” A frase é sedutora: como o jogo é de um publisher, então o esport teria dono. Isso confunde duas coisas distintas:
Ponto chave: ninguém reivindica a PI do jogo. O que se organiza é a prática esportiva que acontece com o jogo.
2) O comparativo com outros esportes
Esports seguem lógica similar: o jogo é propriedade do publisher; a competição pode ter múltiplos arranjos — privados, oficiais de marca e institucionais — desde que respeite a PI e as diretrizes do titular.
3) Onde a lei entra nesse debate (sem juridiquês)
4) “Privado x Institucional” é falso dilema: dá para somar Eventos privados e oficiais de marca dos publishers são livres e saudáveis, Isso é virtuoso do ponto de vista de produto e narrativa oficial.
O institucional não substitui nem restringe — ele coopera, preenchendo gaps de interesse público:
Quando os sistemas se apoiam, todos ganham: publishers estendem o ciclo de vida competitivo do jogo, organizadores privados têm padrões claros, atletas recebem segurança jurídica e patrocinadores veem governança.
5) A retórica do “contra” — e por que ela não fecha a conta
6) Economia real: por que a cooperação é boa para o negócio
7) O caminho de meio: princípios para conviver (e vencer)
8) O que recomendamos para o Brasil entre outros países em 2025
9) Conclusão Esports não têm dono enquanto prática esportiva. O jogo tem; e deve ser respeitado. É possível — e desejável — federar sem ferir a PI, desde que a convivência seja cooperativa e transparente. Quem ganha? O atleta, o público e o ecossistema como um todo.
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